Hospitaleiro voluntário: os primórdios
Na Antiguidade a hospitalidade a um estrangeiro em busca de abrigo era considerada uma grande virtude e sinal de civilidade.
Durante a idade média, a hospitalidade no Caminho de Santiago assume um caráter bastante seletivo, pois até a primeira metade do século XI a Rota Jacobina atraía, geralmente, gente rica e próxima do poder real ou eclesiástico.
Os peregrinos desta época viajavam com sua comitiva, munidos de proteção e recursos próprios. Portanto a existência de hospitais era escassa e desnecessária.
Em meados do século XI, o fluxo de peregrinos cresceu consideravelmente e se estabeleceu a rota – que permanece quase inalterada até hoje – dos Pirineus à Galícia, com a finalidade de proteger e fomentar o movimento de pessoas, bens e ideias.
A monarquia, a nobreza e os bispos, interessados no sucesso deste novo “projeto”, circulavam pela rota jacobina promovendo a fundação e doação de hospitais. Por vezes aproveitando o patrimônio real, por outras, assumindo iniciativas particulares. Mas foram os monges, especialmente os beneditinos, que mais promoveram o desenvolvimento hospitaleiro do Caminho.
Já no final do século XI havia uma rede assistencial, de pousadas monásticas e hospitais, que servia de abrigo aos peregrinos, desde Jaca até Santiago de Compostela.
HOSPITAIS DE PEREGRINOS NO CAMINHO DE SANTIAGO
A prosperidade econômica, os valores religiosos e o apoio aos poderosos que investiam na promoção e segurança do Caminho de Santiago, com novas bases hospitalares, marcaram o século XII e parte do século XIII como o auge das peregrinações. A partir do final do século XIII, quando crescia o número de peregrinos pobres e enfermos, as paróquias e irmandades passaram a ser protagonistas do trabalho assistencial. Leigos, através de doações, conseguiram manter o espírito hospitaleiro nos anos finais da Idade Média.
Durante os séculos seguintes, embora o espírito jacobino tenha declinado e o número de peregrinos diminuído consideravelmente, há muitos relatos de hospitalidade tanto nos hospitais rurais como nos das grandes cidades.
“Porque tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era peregrino e me acolhestes”
Mateus 15:35
O fenômeno contemporâneo dos hospitaleiros voluntários
Na longa história do Caminho de Santiago, a renovação da hospitalidade marcada pela presença de hospitaleiros voluntários leigos nos albergues representa apenas um instante. Encontrar alguém que os mantenha limpos e organizados parece coisa normal, mas nem sempre foi assim.
Após séculos de ostracismo, na última década do século XX, houve um movimento de revitalização do Caminho de Santiago. Neste período era normal que não houvesse uma grande oferta de albergues e quando havia, era um cômodo simples, sem ninguém para limpá-lo ou cuidar do local.
Se de um lado muitos peregrinos do século XXI – após “concluírem” sua jornada – sentem um grande desejo de devolver ao Caminho de Santiago um pouco da atenção generosa e voluntária que dele receberam e se voluntariam para trabalhar em um albergue, por outro lado, muitos albergues precisam de ajuda voluntária para funcionar.
Renasce assim a figura do hospitaleiro voluntário, uma tarefa que mescla componentes materiais, como manter o albergue limpo e organizado, cadastrar e acomodar peregrinos, algumas vezes preparar uma refeição ou ajudar na resolução de um problema, e componentes espirituais, manifestos na disponibilidade, gentileza e capacidade de escuta, apoio e encorajamento ao peregrino.
Ser voluntário num albergue de peregrinos é doar o seu tempo, trabalho e talento, de maneira espontânea e não remunerada, motivado pelo espírito de partilha em prol dos peregrinos e de manter viva a tradição de acolhida e hospitalidade do Caminho de Santiago.
“Quando caminhamos como peregrinos, nos sentimos fluindo pelo mundo;
como hospitaleiros o mundo é que flui por nós.”
Como se candidatar a ser um hospitaleiro voluntário no Caminho de Santiago
Se você já fez o Caminho, tem tempo livre e quer viver o Caminho de uma forma diferente, a Federación Española de Asociaciones de Amigos del Camino de Santiago oferece essa oportunidade para você que quer ter essa vivência única de ser um hospitaleiro voluntário. Uma experiência que certamente enriquecerá e fortalecerá suas relações interpessoais.
A única condição imposta é ter feito algum trecho da peregrinação a Santiago de Compostela e querer dedicar o seu tempo e as suas capacidades com altruísmo para o acolhimento de outros peregrinos.
Normalmente, no primeiro semestre de cada ano, a entidade organiza uma série de cursos preparatórios para aqueles que os contatam via e-mail com a intenção de trabalhar como hospitaleiro voluntário durante o ano em questão. Eles acreditam ser muito importante que os novos hospitaleiros estejam preparados para a realidade que vão encontrar do outro lado do Caminho, que não se assemelha em nada a férias alternativas.
Os cursos acontecem em um fim de semana e são obrigatórios. Excepcionalmente, para pessoas que residem fora de Espanha, é oferecida a possibilidade de passar três dias num albergue para se familiarizar com a rotina do trabalho antes de iniciá-lo.
O tempo de permanência de um hospitaleiro voluntário em um albergue é, geralmente, de 15 dias, durante a primeira ou a segunda quinzena de cada mês.
“Sem voluntários não há albergues e sem albergues não há Caminho.”
Outras opções
Também é possível ser aceito como hospitaleiro voluntário no Caminho de Santiago entrando em contato diretamente com os albergues que não são coordenados pela Federación Española de Asociaciones de Amigos del Camino de Santiago.
Há ainda a possibilidade de se candidatar ao serviço voluntário junto à Fundación Acogida Cristiana en los Caminos (ACC) em diversos albergues de acolhida cristã ou na nova Oficina de Acogida al Peregrino de Santiago de Compostela. Para participar desta iniciativa, que tem por objetivo o serviço aos peregrinos promovendo o aspecto espiritual da peregrinação, é preciso fazer a solicitação via e-mail.
“Depois de fazer cinco vezes o Caminho de Santiago, ser hospitaleiro voluntario da ACC me permitiu conhecer uma dimensão nova da peregrinação. Eu não caminhei, mas senti a proximidade e gratidão dos peregrinos.”
José Javier (52 años, voluntario de Madrid)
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8 thoughts on “HOSPITALEIRO VOLUNTÁRIO NO CAMINHO DE SANTIAGO”
Em 1999 fiz meu primeiro Caminho ,retornei em 2006 duas vezes e fui ajudante da Hospitaleira do Cebreiro..após ia todos os anos fazendo o Caminho e servindo como Hospitaleira no Cebreiro e Hospital de Orbigo. Atendia os peregrinos ,mesmo não falando outros idiomas a não ser espanhol. Limpava os albergues preparava o café da manhã no Hospital de Orbigo e além de ajudá-los em suas bolhas,curativos ,conversando e ouvindo. Os idiomas eram dos mais diversos mas entendamos o que necessitavam.
Sinto falta tanto do CAMINHO como sendo Hospitaleira…
Sempre dividimos o pouco que temos por mais simples que seja….este é o verdadeiro PEREGRINO
Ahhh, que lindo relato Angelica! Imagino todas as coisas que você pode vivenciar nestes Caminhos como peregrina e hospitaleira… Se você quiser relatar suas histórias como mais detalhes, será um prazer publicá-las aqui e para dividir sua rica experiência com nossa comunidade. Grande abraço!
Eu fiz o Caminho Francês em 2014. O Caminho todo né chama para voltar. Sinto muita falta de estar entre peregrinos e moradores locais. Gostaria de me oferecer para ser voluntário.
Em 2006 fiz o meu primeiro caminho juntamente com minha mulher e dois caisais de amigos. Hoje vendo os videos de voluntarios no caminho fiquei muito feliz por ver um depoimento de uma pregrina que foi voluntaria em Grañon,naquele mesmo albergue, eu também fui voluntário (quero dizer fui obrigado a ser) porque o ospitaleiro no dua em que chegamos perguntou se alguém sabia cozinhar e o meu amigo me indicou dizendo queeu cozinhava, tentei de todo jeito sair fora, mas o casal de ospitaleiros não acritaram a minha recusa. Eu então perguntei o que faria de jantar, e eles responderam: o que voce quizer.Então disse que faria um jantar bem brasileiro e bem simples. Arroz, feijão, linguiça frita e ovos fritos, salada de alface com cebolas e tomates. O que foi aceito pelos ospitaleiros, mas até aí eu não sabia em quantos eramos, então perguntei e a rsposta 40 pessoas, isto era 15,00horas e o jantar teria que ser servido para depois da missa ou seja eu tinha poucas horas para preparar e servir tudo entrei em panico e disse que não daria conta, mas os ospotaleiros me tranquilizarme dizendo que pessoas iriam me ajudar. Comecei então os preparativos, tinha quase tufo o que não tinha eles providenciaram muito rapido. Por fim depois da missa o jantar foi servido, e ainda com direito a sobremesa. No final os ospitaleitos me apresentaram aos peregrinos, ao que fui saudado com muitos aplausos e palavras de gratidão por ter feito uma comida tão gostosa, o que me surpreendeu, pois ali havia pesdoas de diferentes países, enfim ganhei até beijos de tamanha gratidão. Foi um dia inesquecível.
Muito boa a explanação sobre o tema. Obrigada
Olá, Vinícius! Obrigada por seu contato! Acho que esse chamado é bem comum entre os que fazem o Caminho e a gente só entende isso depois que passa por esta experiência. Deixo aqui o link para o site https://acogidacristianaenloscaminosdesantiago.org/, onde você pode se candidatar a uma vaga… Boa sorte e Buen Camino!
Que depoimento lindo, José Carlos! Obrigada por compartilhar conosco! O Caminho é mesmo surpeendente e pedagógico, cada dia uma nova história, uma nova lição, um novo entendimento… tudo guardado as nossas melhores lembranças, não é? Um grande abraço peregrino a você, a sua esposa e toda turma…
Muito obrigada pelo retorno, Leila! É muito gratificante ver que nosso trabalho tem contribuido para que mais pessoas possam compreender melhor todo este universo jacobino e se preparar melhor para viver as experiências que ele nos oferece.